Por Breno Bizinoto
Em uma descida técnica estamos atentos a tudo que acontece. Cada barulho que o pneu faz no chão é importante, cada impacto que chega até os nossos braços ou pernas serve como função tátil para tomarmos as decisões da nossa pilotagem, assim como, tudo que chega até os nossos olhos, deve ser transcrito em informação em tempo recorde para a gente decidir o que vai fazer a partir dali. Se você vai virar o guidão e tombar o corpo para a direita, é por que a sua visão te avisou que tem uma curva para a direita ali na frente. Você viu a curva com ANTECEDÊNCIA.
Parece estranho discutir elementos primordiais e instintivos do ser humano como tato, visão e respiração. Por serem ferramentas que usamos desde que nascemos, todos os dias, acreditamos que não precisamos repensá-las durante a prática dos esportes. Errado.
Uma vez escutei uma entrevista do Ronaldo Fenômeno (tenho quase certeza que foi ele que falou isso). Ele dizia que a maior habilidade que um atleta possui, independente do esporte, era a visão periférica. Ele explicou: “Enquanto estou frente a frente com outro jogador e preciso fazer um lance com a bola, meus olhos não estão fixados na bola nem naquele jogador. Preciso observar vários elementos ao mesmo tempo, como a posição de outros 21 jogadores, quem será o próximo jogador que vou ter que dibrar ou pra quem do meu time vou passar a bola. É necessário visão periférica para observar várias coisas que acontecem ao mesmo tempo” – não necessariamente com essas palavras, mas essa era a ideia.
Cara, que loucura. Ele dá um ‘olé’ daqueles sem estar olhando pra bola nem pro jogador e isso faz todo sentido.
Pensem em um esporte como o vôlei. No momento que você mata uma bola que entrou no seu campo, precisa saber exatamente onde cada jogador do seu time está – e pra onde eles estão correndo, sem ter a oportunidade de olhar diretamente para cada um. Visão periférica, tem que ter olho até na nuca!
Você observa uma pedra que está no seu caminho e precisa passar por ela. O nosso piloto automático burro nos coloca em uma situação delicada de medo e fixação na pedra, onde você fica paranoico em observar cada saliência da pedra e passar por ela corretamente, corrigindo os seus movimentos quando sobe na pedra, refazendo sua posição quando desce da pedra, que beleza! Tudo funcionou bem, até que, depois da pedra apareceu um buraco! Um buraco ridículo, pequeno e fácil de passar por ele, mas você, aficionado com a pedra, não viu o buraco com tempo hábil suficiente. A queda acontece, não na pedra, que era grande e saliente, mas no buraco, que apesar de ser inocente, veio como um elemento surpresa.
E assim é uma descida de MTB: depois da pedra tem um buraco, depois do buraco vem uma curva, no meio da curva tem um caco de vidro que pode furar seu pneu. Você precisa sempre ter a sua visão lá na frente. É a visão periférica que o Ronaldo explicou.
Vamos além: me recordo de uma discussão em uma foto, lá nos tempos do facebook. Um amigo postou uma foto dele fazendo uma curva durante uma competição. Nessa foto, ele aparecia com o pescoço totalmente curvado, como se estivesse olhando para fora da pista. Alguém comentou “E esse pescocinho pra fora aí?? Apruma o corpo” e a resposta tem tudo a ver com o que estamos falando: “Nunca ouviu o ditado You look where you go?”
Traduzindo: Você olha pra onde você VAI, não pra onde você ESTÁ. O olhar, sempre a frente, adiantando todas as situações. É pra lá que você vai, portanto é pra lá que você olha. Você vai decorar aquele local e quando estiver lá, vai passar se orientando apenas pela visão periférica.
Várias vezes estou tendo um dia ruim na trilha, sem conseguir desenvolver bem, tomando tombos ou “quase-tombos” toda hora. Nesses momentos, me faço duas perguntas: “Você está respirando? Pra onde você está olhando?”
Em outra oportunidade vamos discutir o quanto a respiração é importante, mas basta que eu reforme a minha posição da visada, para que a pilotagem melhore significativamente e as coisas fluam com mais naturalidade.
Temos a tendência de olhar pra baixo, por ser menos cansativo e dar a falsa impressão de segurança ao analisar mais de perto cada um dos obstáculos, como naquele exemplo da pedra e do buraco.
Precisamos entender também que a distância focal da nossa visada muda de acordo com a velocidade que estamos pedalando. Se você está em uma descida a 50 km/h ou mais, precisa focar a sua visão bem mais distante, pois os obstáculos vão aparecer todos de surpresa e em poucos segundos você já estará passando por eles!
Já em uma subida, pedalando a 15 km/h, você não pode olhar tão longe assim, pois os obstáculos vão demorar muito tempo pra chegar em você e aí nem vai mais ter a memória do que deve fazer quando eles chegarem.
Um exemplo ótimo para isso é fazer uma trilha noturna. O melhor dos mundos é ter dois faróis, assim um vai ser regulado pra iluminar bem de perto e o outro vai ficar mais alto, iluminando mais longe. Se você tiver um farol somente, vai haver a necessidade de ficar subindo e descendo ele com a mão, subindo quando começa uma descida (farol mais alto) e descendo o farol quando começa uma subida (farol mais baixo, iluminando mais próximo).
Óbvio que um farol com foco aberto ajuda a resolver esse problema, mas ainda assim é melhor o uso de dois faróis, com distâncias focais reguladas para velocidades diferentes.
Fica aqui a minha dica de pilotagem: visão periférica para saber onde você está e quais obstáculos estão a sua volta, assim como saber onde estão outros atletas no caso de um pelotão. Visão focal variável de acordo com a velocidade, sempre olhando pra onde você vai, não pra onde você está.
E naquele dia embaçado, que você não está mandando bem, lembre de se perguntar: “Pra onde eu estou olhando?”
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